Foi inaugurada a grande festa da bicharada, da selvageria. Basta ires a um sacolão da rede ABC em alguns recantos da leste Belo Horizontina e terá a seu dispor um perfeito laboratório para estudos de antropologia, sociologia e filosofia. Expresso-me deste lugar, de dentro, e não de quem espreita uma vitrine.
Na superfície, são verduras, legumes, frutas e alguns congêneres embalados para alimentar alguns humanos, a maioria. Por não terem o privilégio de freqüentar as redes multinacionais de gôndolas bem organizadas e corredores bem apropriados para a circulação de gente, tudo muito bem dimensionado no estilo pague mais e tenha conforto, civilidade; eles se esfregam, acotovelam-se e trombam na faminta ordem do salve-se quem puder, pegue quem puder, quem suportar as incivilidades por alguns alimentos a R$0,79 ou R$0,99 o quilo.
Fundaram essas alternativas de venda de hortifrutigranjeiros supostamente mais econômicas a servir os ‘populares’, a servir também a classe média trabalhadora que economiza para gozar um pouco de lazer ou entretenimento nos intervalos laborais. ‘Tá barato, é pacabá’, grita ao fim do expediente o carregador-funcionário, resfestalando-se daquela disputa ‘inumana’ para alimentar o corpo, porque a alma gentil, cooperativa, já há muito se perdeu.
A logística se resume em algumas estratégias ‘curiosas’. Primeiro as prateleiras gigantescas para caber o excesso armazenado, para caber também os deteriorados a contaminar a vizinhança, mas principalmente para gerar o famoso excedente quantidade, porém, de qualidade duvidosa. Segundo, os espaços reduzidos a subsumir o poder de escolha, a gerar as desavenças na filas. Depois, as lixeiras abarrotadas de ‘estragados’, acuados pelo volume e pelo alto preço.
O excesso de gente faz o mesmo, é multidão insana em um processo de contaminação incontrolável. Por uma ilusão de preço baixo em troca de um saco de alimento, manifesta a sua ação irrefletida, manifesta seu despreparo diante dos processos tão bem criados de alienação, sobrevive e se debate a despeito da educação, do respeito pelo outro. Então o lado bicho e primitivo aflora, mas não para a caça ou a coleta daquilo que a natureza oferece e o instinto submete, mas para a coleta artificial, forjada no capital.
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