Radio A Toa

sexta-feira, agosto 20, 2010

Rotina com pedras portuguesas


Estava novamente super atrasada. Corria, tropeçando pelos buracos da calçada com pedras portuguesas que formavam ondas em preto e branco, tropeçou e por pouco não foi ao chão, outro salto de sapato destruído, pensou. Lembrou que demorou muito para encontrar o que vestir, para se maquiar, checar as tralhas dentro da bolsa, se o celular tinha bateria suficiente, se ia conseguir fazer tudo o que precisava naquele dia, se sua sócia não se esqueceria de levar o contrato para o novo cliente assinar...
Ufa, tantos senões que de segundo em segundo, se transformavam em minutos de atraso.
Entrou no metrô e por sorte conseguiu um lugar para sentar e tentar relaxar um pouco. Olhou de soslaio para o lado e percebeu a senhora delicada e bem vestida. Seu perfume era bom e seu rosto demonstrava o tempo da sua experiência. Nas mãos, um esmalte delicado e um anel de pérola antigo. Não era casada e possivelmente, era uma dessas solteironas cheias de manias e perfeccionismos. Arre! Lá estava ela a ficar imaginando coisas. Precisava parar com essa mania. Seria ela uma neurótica, paranóica compulsiva? Riu de si mesma, estava novamente se diagnosticando. Deve ser um sintoma...
De repente, o trem parou em uma estação que também não prestou atenção chegar, entrou uma mulher pequena com um bebê no colo, já ia levantar para ceder o seu lugar, quando um senhor de cabelos grisalhos o fez primeiro. Ele a olhou e lhe dirigiu um sorriso como se não fosse necessário o seu gesto. Gentil e delicado, raro nos dias de hoje.
Mergulhou novamente em seus pensamentos e logo chegou ao seu destino, estação da Carioca. Com ela, um mar de passageiros se precipitou pela escada rolante, preferiu ir pela escada ao lado. Esbarrou em uma sacola qualquer que arranhou a sua perna, puxando um fio da sua meia de seda. Pensou que aquele seria um dia daqueles...
Prosseguiu até alcançar a Avenida Rio Branco, que outrora era famosa pelos seus lindos prédios em Art Déco, com homens e mulheres bem trajados e tranqüilos.
Agora, observava uma profusão de pessoas, camelôs e veículos de todos os tipos, barulho e certo nervosismo nos semblantes, alheios ao seu pensamento saudosista.
Seria este, o ideal futuro que o passado tanto esperou e propagou para a vida humana?
Lá estava ela novamente pensando no tempo que passou, era quase um pedido de socorro. Porém, precisava seguir no presente, atravessar a avenida e deixar o passado do Rio antigo eternizado em fotos e saudades.
Chegou enfim ao prédio onde ficava seu escritório de advocacia, cumprimentou o porteiro, entrou no elevador e apertou o botão que a levaria ao décimo terceiro andar.
Tudo estava calmo, as pessoas trabalhavam e concentradas, nem perceberam a sua presença esbaforida. O telefone tocou e foi o suficiente para acionar seu mecanismo interno de trabalho, trabalho e mais trabalho. Não percebeu que era exatamente aquele “iniciar” que fazia toda a diferença, que a lançava para a vida corrida e que, em curtos momentos de espera, a fazia meditar em sua rotina.
E por falar em rotina, o que será mesmo que faria do seu cotidiano sem ela?

3 comentários:

SIL disse...

SEI LÁ....

ESSA ADVOGAda sem rotina deve ficar num tédio só....daí ela vai ficar com saudades dessa rotina que a faz pensar e imaginar o tempo todo e como era bobona em sentir saudades de coisas "passadas"....rsrsr

"tipo efeito borboleta!"
kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk



amei...bjs

Nina Blue disse...

Obrigada, Sil, vindo de vc é um elogio.
beijos.

Keila Costa disse...

Adorei Nina...essas calçadas portuguesas...esse dia a dia que se repete e nunca, jamais se repete tal e qual...
Beijos